terça-feira, 23 de julho de 2013

Método McKenzie na avaliação e tratamento da articulação temporo-mandibular - estudo de caso clínico

O método McKenzie de Diagnóstico e terapia mecânica® (MDT) utiliza uma avaliação mecânica que consiste em monitorizar os sintomas e as respostas mecânicas a movimentos repetidos realizados até ao limite de amplitude de movimento articular (AM).
Os resultados dos movimentos repetidos são então usados para classificar os pacientes em uma das três síndromes mecânicas: desarranjo, disfunção ou síndrome postural.
Com base nesta classificação, diferentes exercícios e conceitos posturais são utilizados para reduzir o desarranjo, remodelar a disfunção ou corrigir cargas posturais adversas.
Quando utilizado na coluna vertebral por fisioterapeutas treinados, o MDT tem demonstrado muito boa a excelente confiabilidade no diagnóstico e no tratamento dos sintomas. Além disso, a centralização, que é um componente essencial da abordagem, e descreve a abolição da dor distal em resposta a movimentos repetidos, demonstrou validade prognóstica.
Relativamente à avaliação e tratamento das extremidades, um estudo de confiabilidade obteve valores de 83% para um grupo de 97 fisioterapeutas que avaliaram 25 estudos de caso com fichas de avaliação das extremidades, organizadas segundo o método McKenzie.
O objetivo deste estudo de caso foi descrever o regime de avaliação e tratamento aplicado, utilizando os princípios do MDT, a uma paciente com um problema não específico na articulação temporomandibular (ATM). Esta paciente foi classificada e tratada como tendo um desarranjo, de acordo com os princípios do MDT.

Apresentação do caso clínico

  • Paciente do sexo feminino, 30 anos, apresenta-se na clínica de fisioterapia com queixa de dor na ATM esquerda, que esteve presente durante quase sete anos. Às vezes, a dor irradia para o ouvido esquerdo.
  • Os sintomas começaram durante uma operação a um dente, em maio de 1997, durante a qual a sua boca foi mantida aberta por uma cunha dental durante cerca de 30 min. Durante esse tempo, sentiu uma forte dor no maxilar esquerdo.
  • Os sintomas continuaram durante aproximadamente 6 meses. Durante esse tempo, voltou duas vezes ao dentista que simplesmente a aconselhou a dar tempo para a dor passar.
  • Posteriormente, a dor nas articulações lentamente diminuiu, mas a mandíbula começou a bloquear várias vezes ao dia. Se abria a boca não podia fechá-la novamente, a menos que ajudasse a com as mãos. Mastigar os alimentos, bocejar e falar em voz alta aumentava a frequência dos bloqueios na articulação.
  • Em 1998, uma segunda dentista começou a terapia com um aparelho maxilar para uso noturno. Em 1999, teve 5 sessões de quiropraxia para a dor na mandíbula e, em seguida, em 2000, consultou um outro dentista. Nenhuma dessas intervenções ajudou, mas ao longo do tempo a rigidez e a dor pioraram, sentindo por vezes que o queixo estava a “sair do lugar”.
  • A paciente mudou os seus hábitos alimentares, preferindo os alimentos que não precisam ser mastigados ou cortar os alimentos em pequenos pedaços. Também descobriu que se desviasse a mandíbula para a esquerda conseguia abrir um pouco mais a boca, e que conseguia desbloquear a mandíbula com esse mesmo movimento.
  • Durante vários anos, apenas tentou viver com o problema, mas depois este começou a piorar, com a dor a irradiar para a orelha esquerda, tornando-se constante novamente, e aumentando em gravidade a partir de 1/10 para atingir por vezes 8/10.
  • Por causa do agravamento da situação, em 2004, o seu médico de família encaminhou-a para um cirurgião oral e maxilo-facial no hospital. No entanto, estava relutante em submeter-se a uma nova cirurgia, por causa da sua experiência anterior e, em vez disso, decidiu contactar um fisioterapeuta.

Avaliação clínica (1ª consulta)
  • Atualmente, a sua capacidade funcional estava extremamente limitada e tinha dor constante. O seu sono foi perturbado por causa das dores nas articulações e sofria de extrema rigidez matinal na mandíbula.
  • Um exame de triagem para despiste da coluna cervical como origem dos sintomas, que consistia em movimentos únicos e repetidos nos planos sagital e frontal, revelou nenhuma restrição de movimentos ou resposta sintomática ou mecânica.
  • No exame da ATM a paciente relatou uma dor em repouso na ATM esquerda de 2/10.
  • Abrindo a boca demonstrou uma perda moderada de movimento que era muito doloroso no final da AM. (O MDT utiliza medidas não específicas para a perda de movimento: leve, moderado e grande, que apesar de imprecisos são significativos para o avaliador e relevante no caso de pacientes individuais.)
  • Tanto fechar a boca como cerrar os dentes aumentaram a dor local na ATM esquerda. O desvio lateral esquerdo estava moderadamente limitado e doloroso em toda a AM. O desvio lateral direito não restava limitado, mas era doloroso durante todo o movimento e a paciente teve a sensação de que a mandíbula iria sair do lugar.
  • Ambos os desvios eram dolorosos, mas como o direito também causou a sensação de subluxação foi decidido explorar esse movimento com os movimentos repetidos. (A prática clínica tem demonstrado que o movimento provocador pode frequentemente ser o mais informativo em termos de diagnóstico.)
  • Um conjunto de 10-15 repetições aumentou os seus sintomas, e tornou os movimentos laterais ainda mais limitados, agravou também o sentimento de subluxação, até que ela mal podia repetir os movimentos.

Tratamento (1ª consulta)
  • Dada esta resposta negativa, o desvio lateral esquerdo foi o próximo movimento a ser explorado.
  • Os seus sintomas iniciais eram de dor 6/10, e, em seguida, a paciente foi convidada a realizar 10-15 repetições. Durante a repetição de desvio lateral esquerdo relatou que o movimento era cada vez mais fácil de fazer e menos doloroso. Após a conclusão de dois conjuntos de repetições, a dor permanecia apenas no final da AM, não relatando nenhuma dor em repouso.
  • Numa reavaliação rápida as AM tinham aumentado e eram muito menos dolorosas. No desvio lateral direito, o sentimento de subluxação desapareceu, mas a dor ainda estava presente.
  • As estratégias de auto-tratamento nas 24h seguintes foram 10-15 repetições de desvio lateral esquerdo a cada 2h, e tentar evitar fatores agravantes, como mastigar, falar alto ou bocejar. A paciente foi instruída para executar as repetições até ao limite de AM possível em cada repetição.

2ª Consulta
  • A paciente foi novamente no dia seguinte para confirmar o diagnóstico e aplicação da terapêutica mecânica. Ela relatou que havia realizado seus exercícios a cada 2 h, tendo demonstrado na consulta um desempenho preciso nos mesmos.
  • A dor ao acordar, dor ao comer e rigidez articular ainda estava presente na ATM esquerda, mas cerca de um quarto do que tinha sido.
  • Ela agora demonstrou perda movimento mínimo em todas as direções com a dor no final da AM, exceto no desvio lateral direito, onde o sentimento de subluxação ainda estava presente. Não havia dor em repouso.
  • Nesta consulta a paciente foi orientada para progredir na resistência aplicada através da aplicação de sobre-pressão no sentido do movimento, usando as mãos para apoiar a maxila esquerda, empurrando com a mão direita a mandíbula direita (como demonstrado)
  • Como resultado, a dor no final da AM aumentou na mandíbula esquerda, mas não piorou em resultado dos movimentos repetidos.
  • A paciente foi instruída a realizar este exercício 10-15 vezes a cada 2 horas e limitar mastigar alimentos.


3ª Consulta
  • A paciente foi mais uma vez no dia seguinte para garantir que a sobrepressão estava a ter o efeito desejado.
  • Ela relatou que tinha realizado o movimento de sobrepressão a cada 2 h, e demonstrou que tinha sido executado corretamente.
  • Na verdade relatou que, a cada repetição, tinha ficado mais fácil de fazer, que tinha dormido a noite toda sem acordar devido à dor e não tinha dor ao acordar pela manhã. Além disso, não tinha nenhuma dor ao comer o pequeno-almoço e almoço e nenhum sentimento de perda de movimento ou rigidez, como resultado de comer.
  • Na re-avaliação, a paciente demonstrou movimento completo e livre de dor em todas as direções, exceto desvio lateral direito, onde sentiu uma leve dor, mas nenhum sentimento de subluxação. Com base na re-avaliação, ela foi instruída a continuar com os exercícios de desvio lateral esquerdo com sobrepressão a cada 2 h por mais 24 h.


4ª Consulta
  • Uma semana depois, a paciente voltou sem queixas de dor. No exame, todos os movimentos activos estavam completos e sem dor. Não era mais possível reproduzir a sensação de subluxação associada ao desvio lateral direito.
  • A paciente recebeu alta com instruções para voltar se houvesse qualquer reaparecimento dos sintomas ou problemas.


Seguimento de longo prazo
  • No acompanhamento por telefone, um ano depois, a paciente relatou que havia permanecido livre de dor, sem limitações funcionais e que era capaz de mastigar alimentos livremente, cantar, mascar pastilha elástica, e dormir durante a noite.
  • Por acaso a paciente foi encontrada na rua, alguns anos depois. Ela relatou que não tinha tido nenhum retorno dos sintomas da ATM e conseguido um retorno completo da função, com capacidade para comer o que quisesse, bocejar, cerrar os dentes e cantar bem alto, sem medo de mais problemas.


Conclusão

Este estudo de caso detalha a história e avaliação de uma mulher que se apresentou com dor na ATM, não específica, tipicamente crónica. Durante o exame físico, o uso de movimentos repetidos, em linha com os princípios de tratamento de MDT foi capaz de reduzir e posteriormente eliminar os sintomas e restaurar uma amplitude completa de movimento, livre de dor. Os movimentos na chamada direcção de preferência reproduziram os seus sintomas e restabeleceram a sua funcionalidade. Este é um dos primeiros estudos que utiliza este método para avaliar e tratar um paciente com um problema crónico na ATM, mais e mais significativos estudos serão necessários para corroborar estas conclusões.


Krog C, May S. Derangement of the temporomandibular joint; a case study using Mechanical Diagnosis and Therapy. Man Ther. 2012 Oct;17(5):483-6.


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